A CIÊNCIA DO SER HUMANO UNITARIO DE MARTHA ROGERS E SUA VISÃO SOBRE A CRIATIVIDADE NA PRÁTICA DA ENFERMAGEM


A ciência do ser humano unitário de Martha Rogers e sua visão sobre a criatividade na prática da Enfermagem. O artigo aborda algumas formas de utilizar e conceitualizar a criatividade na prática da Enfermagem sob o ponto de vista de Martha Rogers, teorista norte americana, A ciência do Ser Humano Unitário de Rogers considera que a utilização do potencial criador dos enfermeiros é essencial para o desenvolvimento da prática e do corpo de conhecimentos de enfermagem. UNITERMOS: criatividade, potencial criador, ser humano unitário, holístico, ciência da enfermagem, teorias de enfermagem. O tema criatividade na enfermagem é pouco encontrado em literatura brasileira, sendo que a função criadora é considerada por Horta três como um dos instrumentos básicos utilizados no universo da Enfermagem. No entanto em países onde a ciência da enfermagem encontra espaço para o pleno desenvolvimento das teorias de enfermagem como requisito básico da prática profissional, como nos  Estados Unidos,  por exemplo,  esta função é bastante explorada e tem sido considerada uma característica importante do perfil do enfermeiro,  frente às rápidas mudanças tecnológicas e do pensar humano que vêm ocorrendo neste final  de século.  A teoria de enfermagem que melhor abre portas à exploração da criatividade dos enfermeiros em sua prática diária é, seguramente, a Ciência do Ser Humano Unitário de Martha Rogers. E a partir dessa colocação que surgiu a necessidade de aprofundar estudos relativos a esse potencial sob a visão futurista e visionária de Rogers, uma das primeiras enfermeiras a lançar mão da nova ciência, através da Fenomenologia e da Teoria de Sistemas, na construção de um modelo conceitual de enfermagem. "A arte da enfermagem constitui-se na aplicação imaginativa e criativa dos conhecimentos científicos próprios da profissão, com o intuito de servir à humanidade." Faz-se necessário, antes de explorar a questão específica da criatividade para Rogers, falar um pouco sobre a teorista e suas propostas para a enfermagem.

MARTHA ROGERS - BREVE HISTÓRICO

Martha Elizabeth Rogers nasceu em Dallas, Texas, em 1914, vindo a falecer em Nova Iorque, em março de 1994, com 80 anos. Graduou-se enfermeira em 1937 com especialização na área de saúde coletiva. Em 1945, tornou-se mestre em saúde pública. Em 1952, já doutora em enfermagem na mesma área, concluiu o primeiro de nove PhD. Após vários anos de trabalho coordenando serviços de saúde coletiva, entrou para o mundo acadêmico na Universidade de Nova Iorque onde dirigiu a Divisão de Educação em Enfermagem por vinte e um anos, até receber o título de Professora Emérita. Dentre as inúmeras homenagens e títulos que recebeu, foi honrada pela NASA com a concessão de seu nome a uma estrela da constelação Ursa Maior. Produziu dois livros próprios, inúmeros capítulos de livros de enfermagem, além de incontáveis palestras, conferências e mais de uma centena de artigos publicados em revistas.  Até meses antes de falecer, manteve-se ministrando aulas aos alunos dos cursos de graduação e pós-graduação da Universidade de Nova Iorque.

A CIÊNCIA DO SER HUMANO UNITÁRIO DE ROGERS

Estudar a Ciência do Ser Humano Unitário de Rogers é um ato fascinante pela forma criativa e estimulante como a teorista conduz seu modelo teórico. A questão da criatividade se mostra presente em praticamente todos os textos de Rogers. Para que se possa compreender o valor que a teorista atribui a essa capacidade intelectual humana, faz-se necessário explorar alguns pressupostos que compõem a Ciência do Ser Humano Unitário. O pensamento criativo da ciência rogeriana propõe a transformação da prática da enfermagem em um sistema terapêutico independente, que promova a saúde e calcado na utilização da energia e em processos não invasivos, como é o caso da aplicação do Toque Terapêutico, derivado da teoria de Rogers. A aplicação de tais métodos torna-se viável a partir da compreensão de que, para Rogers, a realidade é não-Iinear, mas circular, rítmica e virtual. Assim, o trabalho a ser desenvolvido por enfermeiros rogerianos é parte integrante da dinâmica universal, que é cíclica, contínua, em constante movimento, rítmica e que evolui sempre para estados inovadores, o que envolve uma função criadora constante no processo vital humano. Essa colocação de Rogers nos oferece uma forma de ver o mundo em que este é um todo holístico e integrado que contradiz o ponto de vista mecanicista e reducionista predominante no modelo médico cartesiano, colocando o ser humano como um todo indivisível e como sendo o foco das ações de enfermagem. Num mundo encarado como holístico, onde o todo é muito mais do que a soma de suas partes, o universo de trabalho rogeriano se configura na Ciência do Ser Humano Unitário, onde:
-- O individuo é um todo unificado, indivisível e totalmente integrado ao ambiente, sem que possa ser reduzido a sistemas, órgãos e células, interagindo com infinitas dimensões que compõem o universo (universo pandimensional);
-- O indivíduo é caracterizado como um campo energético humano em interação constante com este universo pandimensional;
-- O campo energético humano é um sistema aberto em troca ininterrupta de energia com o ambiente, ao qual está integrado, configurando um campo energético suficientemente forte para se estender ao infinito;
-- Tanto o campo humano quanto o ambiental estão sujeitos, a constantes mudanças que, ao ocorrerem, provocam alterações simultâneas nos dois campos. Este processo contínuo de mudança é considerado por Rogers como sendo de crescimento e atualização, configurando um processo criativo contínuo.
Enfim, o processo de integração constante, indivisível e total entre os campos humano e ambiental é definido por Rogers como integralidade. As mudanças continuas que ocorrem entre ambos implicam em trocas energéticas com variadas frequências de onda, intensidade e velocidade de respostas, caracterizadas pela teorista como ressonância. As respostas provocadas pelas continuas modificações que ocorrem nos campos humano e ambiental têm uma única direção, onde o processo passado vai sendo incorporado ao presente num ritmo dinâmico e não-linear de padrões de resposta, o que Rogers denomina helicidade.
Parece complicado, porém, à medida que percebemos nos pressupostos de Rogers que podemos utilizar nosso potencial criativo em dimensões nunca antes imaginadas para, como ela mesma diz, "servir à humanidade por meio da Enfermagem", a gama de possibilidades terapêuticas que se apresentam, torna o estudo desta teoria simplesmente fascinante.
Rogers cita em inúmeras conferências que o enfermeiro deve utilizar a criatividade na elaboração de métodos de trabalho e na exploração de novas modalidades terapêuticas.
"Clarividência é algo racional se vista sob o ângulo da interação simultânea entre os campos pandimensionais humano e ambiental, assim como certos eventos como a psicometria, a telepatia, o toque terapêutico e uma enorme gama de fenômenos."

ROGERS E CRIATIVIDADE

O foco da ciência da enfermagem para Rogers é o ser humano unitário, que é contínuo, evolutivo, indivisível, incerto, em constante troca energética com o ambiente e que utiliza ininterruptamente seu potencial criativo, ao se readaptar a cada mudança que ocorre nos campos humano e ambiental. O ser humano unitário descreve Rogers, caracteriza-se ainda pelo uso da abstração, sensação, emoção, imaginação, linguagem e pensamento produtivo.
Este ser humano, incluindo o enfermeiro, é, portanto, um ser acima de tudo criativo e que depende de seu potencial criador para sobreviver a cada alteração dos padrões energéticos dos campos humano e ambiental. O ponto de partida para a utilização do potencial criador na arte de viver do ser humano unitário e na arte de se praticar a enfermagem, portanto, concentrasse na questão da pandimensionalidade.
Rogers afirma que "a criatividade da vida emerge para o exterior da interação ser humano-ambiente, ao longo do processo continuo de seu ciclo vital. O campo humano é continuamente alimentado e acrescido de novas dimensões de complexidade crescente e estende-se para todas as direções, projetando-se para o futuro da mesma forma que para o passado. O homem move-se de forma a transcender a si mesmo, o que se caracteriza pela infinita gama de possibilidades na utilização de seu potencial criativo". A pandimensionalidade permite, portanto, a flutuação continua entre as fronteiras imaginárias do ser humano unitário. Esta realidade, que é virtual, é percebida como uma síntese de coordenadas não lineares, através das quais as mudanças inovadoras continuamente emergem.
Rogers abre as portas para a criatividade dos enfermeiros ao proporcionar a exploração de fenômenos, que até então eram tidos como "paranormais", como métodos terapêuticos viáveis, não invasivos e cientificamente embasados, como é o caso do Toque Terapêutico (TT). O ensino do TT já faz parte do currículo de inúmeras universidades norte-americanas, canadenses, japonesas, suecas e do Reino Unido. Nessas universidades há disciplinas específicas sobre a Ciência do Ser Humano Unitário de Rogers e há cursos de especialização em TT (latu senso).
A partir da década de 80, surgiram os primeiros grupos organizados de enfermeiros que começaram a estudar as aplicações práticas e criativas da referida teoria. Um desses grupos é a "Society of Rogerian Scholars", que promove eventos nacionais e internacionais, além de possuir publicações que reúnem discussões e reflexões sobre a Ciência do Ser Humano Unitário e sobre sua aplicação na prática da enfermagem, o que vem validando a teoria.
Seguem algumas citações sobre aplicações da teoria, realizadas com sucesso:
- utilização do TT na alteração dos níveis de hemoglobina e na cicatrização de feridas;
- propostas de atuação para o enfermeiro visando à utilização do seu potencial criativo na promoção do conforto ao paciente-cliente;
- controle da dor em pacientes cancerosos, através da aplicação de luzes em diferentes comprimentos de onda associadas à cromoterapia;
- redução dos padrões de movimentos em crianças hiperativas através da repadronização dos campos humanos e ambiental;
- desenvolvimento de um Guia Efetivo de Avaliação dos Padrões de Resposta na assistência de enfermagem à criança portadora de variações cardíacas;
- a oportunidade de desenvolvimento de participação consciente: um novo esquema para a Organização do Serviço de Enfermagem.
Há enfermeiras brasileiras desenvolvendo trabalhos no campo do TT, da cromoterapia e no uso dos florais do Dr. Bach, utilizando o modelo conceituai de Rogers como referência. Em se tratando de abordagem fenomenológica, estes estudos demandam atenção mais acurada em seu desenvolvimento, o que vem postergando sua publicação na literatura científica.
Para Rogers, a fenomenologia é um caminho para que o enfermeiro clarifique o papel da ciência no acesso e evolução dos fenômenos com os quais o ser humano se depara, rompendo a barreira do que se denominou até então de meta-ciência. Para tal, é preciso que se amplie a visão de mundo dos enfermeiros, a partir do estudo aprofundado e constante do fenômeno da enfermagem.
"Se aceitarmos que uma pessoa é um campo energético, torna-se fácil explorar modalidades terapêuticas como o TT, a meditação ou a musica, por exemplo. A visão de mundo dos indivíduos costuma refletir o sistema de crenças dominante. Eis o porquê de se analisar a questão da visão d e mundo, a fim de dar espaço para o desenvolvimento de nosso potencial criativo."
Rogers.

CONCLUSÃO

 A função criadora surge na Ciência do Ser Humano Unitário de Martha Rogers desde sua estruturação até sua aplicação na prática da Enfermagem, rompendo barreiras e transcedendo fronteiras inexploradas pelo homem, contribuindo para a evolução científica da profissão.
Rogers propõe formas de desenvolver essa prática e conclui que a criatividade é um dos principais recursos de que dispomos para alcançarmos esse desenvolvimento. Milhares de enfermeiros mudaram sua visão sobre a enfermagem ao se depararem com o estudo da Ciência do Ser Humano Unitário e vêm utilizando seu potencial criador na busca de novas práticas não invasivas e efetivas de servir à humanidade.
Como diz Rogers, "o futuro é agora", portanto, reescrever a história da enfermagem depende da utilização desse potencial e do aprofundamento de nossos estudos frente ao fenômeno da Enfermagem.
SÁ, A. C. Roger's Science of Unitary Human Beings and its view about creativity in Nursing practice. Rev . Esc . Enf. USP, v. 28, n.2, p . 171-6 , aug. 1994.
The article describes some of the uses and conceptualizations about creativity in. nursing by the point of view of Martha Rogers. Rogers' Science of Unitary Human Beings considers the use of nurses' creative potential as something to develop nursing knowledge and practice.
UNITERMS : creativity , creativ e potential, unitary huma n beings, holism, nursin g science , nursin g theories.

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